domingo, 20 de janeiro de 2008

O Plot do acaso

Tenho um problema com as chaves. Isso não renderia um texto ou sequer uma segunda pontuação em qualquer brochura de raciocínio ocupado por aí, mas faço pelo minimalismo como predicado da questão.

Começa com o procurá-las na bolsa e com o movimento neurótico das mãos no escuro. Os dedos tateiam todas aquelas coisas inúteis que carrego simplesmente por achar graça em ter um punhado de objetos que não fazem sentido em conjunto e que, separados, teriam um propósito chato, tal como as demais coisas que já tateei no claro. O som daquilo tem seu próprio enredo, aquela minha parte agora um inseto gigante, com cinco patas, que se enrosca e se debate no breu portátil, de vinil branco e poliéster, e uma bela estampa de cinema na frente.

E então que chega a cara do meu problema. Imagino-me encontrando o chaveiro, coisa que, eu sei, vai acontecer em poucos segundos. Mas o porquê de eu planejar esse encontro nos segundos antes eu nunca sei. O jeito que meus dedos vão tocar a ponta da chave maior, o dedão que irá encontrar-se primeiro com emaranhado de metal, tudo se projeta prazerosamente no cérebro, muito mais veloz do que meu membro que ainda é inseto e que ainda procura. E, quando a mão finalmente volta a ser mão, agarrando por acaso o chaveiro, eu o largo de volta no escuro. Eu começo denovo, só porque o encontro não ocorreu daquele jeito que a mente previu, naqueles segundos perdidos de antes.

Há dias que passo tempo demais para abrir a porta de casa, as chaves denunciaram meu gosto pelo acaso planejado. Mas admitamos, estou longe de ser única. Planejam-se vidas, perguntas espontâneas, respostas inesperadas. Planeja-se amor, planeja-se sexo casual, jeito de morrer. Eu planejo como encontrar minhas chaves, e isso já é meu problema. Não contenho o vício de dramatizar cada estupidez cotidiana, é patético, é fantástico.

4 comentários:

Unknown disse...

Os acasos fantásticos são melhores que os fantásticos Fantástiscos, ou ao menos, não são redundantes. E você cara Samanta, chega um estágio da vida em que tudo o que queremos é o fim da redundancia prática da genealidade alheia.
Mas você é genial, e eu começo a achar que o Jornalismo não te merece.
Suave Tex
bjs

Unknown disse...

como é a estampa com cara de cinema?! =D

Unknown disse...

Vou comprar seu livro, quando o mesmo existir... Vc ganhou um fã Samantha!
hahahhahah

Pedro Zambarda disse...

Gosto de planejar enrolar meus fones de som, seja do Discman ou do MP3.

É incrível. Depois tenho que parar e desenrolar. É um esporte mais complicado que sudoku.