segunda-feira, 7 de maio de 2012

Prelúdio do inferno astral

Discuti com aquela garota que me encarava no espelho. Não costumo passar por ali e ficar por mais de cinco minutos, é briga na certa.

Mostrei a língua para aquela menina. Preciso de um pente. Me falta um dente. No clã dos Lobo eu sou aquela que não tem um canino. Perdi na rua, pequeno acidente de motocicleta que declamo a terceiros como Ilíada, como Odisséia, como uma música do Zé Ramalho. O sorriso que ficou torto, meio puxado para a direita, merece.

Dê um pente para essa menina. Falta um canino ali, do lado esquerdo. O sorriso ficou meio de lado, ela não para de olhar para trás. Ela está me olhando por dentro. Rindo. Chorando. De boca torta. Ela fala sozinha, assopra e desenha no vidro do espelho. Contornou meus medos com vapor e a ponta dos dedos. Derrubou os olhos em mim. Mas que confusão. Mas que adorável.

Dei um sorriso para aquela menina. Declaramos trégua. Em paz até a próxima década.

Olhando pela última vez, já de soslaio, já não parece que lhe falta nada.

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